quarta-feira, 9 de julho de 2014

COLHERADA // Jantando num reality

Erika Klingl
Colunista e Crítica de Gastronomia do Gastronomix

Adoro programas de culinária. Ainda criança, dividia o meu tempo livre à frente da televisão entre a Turma do Balão Mágico e a Cozinha Maravilhosa da Ofélia. Com a chegada da TV paga essa mania virou quase um vício. Não importa muito a nacionalidade da gastronomia e nem se eu vou algum dia repetir a receita ali apresentada...

No início do ano, numa viagem a Londres, organizei minha agenda e minhas finanças para conhecer a culinária do todo poderoso Gordon Ramsay um dos mais emblemáticos chef/celebridade conhecido principalmente pelo humor ácido e gritos cheios de palavrões, mas que resgatou pratos clássicos e já esquecidos como o Filé Wellington...

Só em Londres, ele tem 12 casas. Então, qual escolher? Pesquisa daqui, olha os menus dali, lê os livros de receita dele acolá. Como decidir? Como não podia deixar de ser, a decisão veio de um outro programa de TV. Um documentário apresentou a chef Clare Smyth. Ela lidera a brigada do mais importante restaurante dele, tanto que recebe o nome de Restaurant Gordon Ramsay e fica no elegante bairro do Chelsea.

Não é pouca coisa não. Aos 35 anos, Clare chefia a cozinha com três estrelas Michelin, sendo que foi a primeira mulher da Europa a ter essa responsabilidade. São pouco mais de dez mesas. E o menu é enxuto e concebido por ela sob a tutela do chefe.
Como faço nos restaurantes cujo chef é um destaque, fui direto na opção de menu fechado e harmonizado. Faço isso porque acredito que é uma ótima maneira de entender como o chef (ou a chef no caso) pensa. No Restaurant Gordon Ramsay, essa opção recebe o nome de Menu Prestige.

Podia adotar um tom meio blasé e tratar essa minha aventura gastronômica como uma coisa corriqueira. Mas me desculpem não vou fazer isso. Foi incrível mesmo. Do lado de fora do restaurante fazia algo em torno de 5 graus. Lá dentro, a iluminação e o som ambiente de um jazz mais contemporâneo eram o convite para se passar horas e horas comendo, bebendo e conversando. E foi o que eu fiz. Uma delícia atrás da outra.
Os destaques foram um prato de peito de pombo (confesso que tinha certo preconceito, mas passou completamente) e um parfait de limão siciliano que fechou o jantar. Pesquisando, descobri que o pombo foi a primeira intervenção da chef Clare ao menu do Ramsay. Até então, os preparos eram criação dele mesmo. O peito de pombo vinha acompanhado de uma polenta e um pedaço generoso de foie gras.

O ponto da carne, bem rosado e suculento dava o tom do perfeccionismo da cozinha. O capricho percorreu todo o jantar e foi apresentado também na tuille de mel que vinha sobre o parfait de limão. Uma obra de arquitetura que dava até dó de quebrar. Não tive coragem de tirar fotos porque era tudo meio formal demais. Mas o site do restaurante me salvou.
Agora, antes que alguém pergunte, não vi o chef Gordon. Mas não senti falta do seu jeito truculento ao lidar com a brigada da cozinha. Porque em diferentes momentos do jantar ouvíamos a chef Clare descascar algum auxiliar. Ela gritava mesmo para todos ouvirem se algo não estava no jeito que deveria com a temperatura, apresentação ou sabor. A cena que seria inadmissível em qualquer outro restaurante desse nível do mundo, ali fez todo o sentido. Afinal, Clare representa a Hell’s Kitchen.

Restaurant Gordon Ramsay
Royal Hospital Road 68
Chelsea - Londres
Telefone: 020 7352 4441
www.gordonramsay.com/

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