segunda-feira, 23 de setembro de 2013

EU RECOMENDO // A chef do Brasil profundo

Por Alexandre Staut(*)
Convidado especial do Gastronomix

Seriguela, pequi, tucumã, abacaxi selvagem, bolo de arroz, ensopado de pacu, piranha e piraputanga, mojica de pintado, farofa de banana, rapadura de leite, furrundu (doce feito com tronco de mamão), melado de cana, coco e gengibre, suco de guaraná, veado, paca, cateto, perdiz do mato, pombo, pato selvagem e marreco.

Quem me fala sobre todos esses ingredientes e receitas é a chef Edir Nascimento, proprietária da rotisserie 339 Gastronomia, em São Paulo e em São Carlos, no interior. Edir é uma grande chef brasileira que tem conhecimento profundo do País e de suas delícias. O que a distingue de chefs da moda que também trabalham os produtos brasileiros é que ela nunca precisou sair a campo para pesquisar ingredientes. Nascida em Poconé, no Pantanal, no colo de uma aldeia indígena, ela leva todos esses produtos na alma.
Meu encontro com Edir Nascimento ocorreu em 2000. Eu trabalhava na Revista da Folha, da Folha de S. Paulo. Ela era chef de uma casa chamada Restaurante, na capital paulista. Liguei para pedir uma receita. Assim nos aproximamos. Ela passou a me contar diversas histórias da sua terra natal... suas aventuras gastronômicas.

Mais tarde, ficamos amigos. Vi a chef lançar dois livros – Banquete dos Sentidos I e II -, em parceria com a restauratrice Lúcia Faria, do Alucci Alucci. Eu a vi também se mudar para Paris, onde cursou Le Cordon Bleu. Depois a vi abrir o seu 339 Gastronomia, em parceria com a sua irmã, Ana. Além de casa de massas, o endereço funciona como rotisserie e oferece o serviço de “chef em casa”. É uma rotisserie de primeira.
De todas as histórias ligadas ao mundo gastronômico que ouço por aí, as que mais gosto são aquelas em que a chef fala da sua infância, nos arredores de uma tribo Tupi-guarani, no Mato Grosso... numa época em que ela não imaginava que passaria por cozinhas grã-finas do Brasil e da França. Gosto quando ela conta que, quando tinha dez anos, sua mãe lhe dava as primeiras lições de culinária, com foco no produto.

Menina, ia até um poço, ao lado de casa, acendia o fogão à lenha e fazia bolos de arroz, arroz carreteiro, cozinhava as caças trazidas por seu pai. Ela tinha dentro de si isso que hoje chamam por aí de alma de pesquisador. Mas ela não precisou fazer expedições fora de si. Bem, ela até fez isso, mas os sabores e temperos do Brasil profundo, assim como as raízes, tudo sempre esteve às suas mãos.


(*) Alexandre Staut é jornalista e escreve sobre gastronomia e comportamento. É também escritor, autor dos romances “Jazz Band na Sala da Gente” (2010) e “Um Lugar para se Perder” (2012).

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