quarta-feira, 18 de abril de 2012

AO PÉ DO OUVIDO// Senso de humor e senho crítico

Por Rosualdo Rodrigues

Zeca Baleiro deu entrevista à Bravo, na qual solta farpas contra a mania de Caetano Veloso -- a quem chama de “comadre linguaruda” -- de dar opinião sobre tudo (“ninguém perguntou, então não fala, pô”) e contra a chatice de Lulu Santos, “uma pessoa insuportável”, segundo ele – impressão comprovada em uma “experiência desagradabilíssima” que o próprio Zeca teve com Lulu nos bastidores do Altas horas, da Globo.

Apesar de tudo, o tom da matéria é simpático. E essa capacidade de ser crítico sem assumir
um tom rançoso ou mal-humorado é perceptível também em O disco do ano, o novo CD de Zeca Baleiro. A propósito, o disco é o mote da entrevista dada por ele à principal revista cultural do país. Nela, o cantor e compositor maranhense também explica que o título não tem nada de pretensioso, é muito mais uma provocação.

É fácil encontrar esse mesmo misto de bom humor e questionamento nas faixas de O disco do ano. Zeca lança um olhar crítico em direção à imprensa cultural (Mamãe no Face), às promessas de amor eterno (Tattoo), àqueles que só veem o próprio umbigo (Nada além), ao impulso consumista que rege o mundo (Desejo, com participação de Chorão), à visão clichê da relação amorosa (O amor viajou) e da felicidade (Felicidade pode ser qualquer coisa).

No entanto, se propõe “questões” (como dizem os acadêmicos), O disco do ano em momento algum posa de disco de protesto. É um exemplar de bom e puro pop, que nem por isso descarta o exercício pensante. Zeca mostra que fazer música acessível não significa, necessariamente, recorrer a refrões tão pegajosos e desprovidos de sentido.

Contra o tom em princípio, digamos, sombrio de alguns desses temas, O disco do ano traz uma sonoridade solar, proporcionada pelo afinado trabalho de nada menos que 15 produtores -- revezando-se em 12 faixas, que passam pelo reggae (Último post, com Margareth Menezes), pelo hip-hop (O desejo), pelo rock oitentista (Meu amigo Enock, com participação de Andreia Dias), pelo brega setentista (O amor viajou) ou pela balada romântica (Zás).

Esta última, umas das mais bonitas do disco, é uma parceria com o alagoano Wado. Aliás, além do extenso time de produtores e participações especiais, o disco traz parcerias de Zeca com Frejat (Nada além, já gravada pelo ex-Barão), Hyldon (Calma aí, coração), Lúcia Santos (poetisa irmã do artista, em Último post) e Kana (O amor viajou). Cada um ajuda, a sua maneira, para que o disco seja, se não o do ano, pelo menos uma bem-humorada e fresca reflexão sobre o estranho mundo em que vivemos.

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