quarta-feira, 27 de julho de 2011

AO PÉ DO OUVIDO// A ema geme em SP

Por Rosualdo Rodrigues

A noite mal tinha começado e o “japonês” de óculos já havia tirado umas três ou quatro damas pra dançar. Uma a uma, rodopiava com elas pelo salão, ora agarradinho, ora pegando-a pela mão, afastando-a e fazendo-a girar. A moça muito magra e muito alta de cabelo curtíssimo, tipo modelo, com jeito de frequentadora do Baixo Augusta, também já tinha trocado de par algumas vezes e dançava igualmente com visível prazer e invejável disposição. Fora da pista, a negra de flor no cabelo, que parecia saída de um quadro de Di Cavalcanti, batia papo com amigos e distribuía um sorriso que benza-deus, mas não demorou a ser convidada para dançar, e sair se balançando ao som de Jackson do Pandeiro.

Sábado, assistindo à movimentação no Canto da Ema, me ocorrem duas coisas (que, diga-se, não são nenhuma novidade): 1 ) “Paraíbas”, “baianos”, “cearás” e “cabeças-chatas” em geral têm uma participação nada modesta na definição do perfil cultural e comportamental de São Paulo (ainda que alguns paulistanos p
referissem o contrário); 2 ) Forró sempre foi pop, por excelência. Só um país de autoestima baixa poderia relegar à periferia, a um gueto ou a um período específico do ano uma música tão rica, contagiante, quente, dançante... E a moçada que está ali sabe disso. Toca Jackson, Gonzaga, Maciel Mello, Marinês, Trio Nordestino, Flávio José... e a pista se mantém cheia.

Canto da Ema é uma casa de forró que fica em Pinheiros, na capital paulista, e que funciona de quarta a domingo, quase sempre lotada (a capacidade é para 500 pessoas). A noite começa com música mecânica e lá pelas tantas entra no palco algum trio -- como o Sabiá, atração do sábado – ou cantor – domingo teve Dominguinhos. Só forró pé-de-serra, sem distinção se é uma gravação de 1950 ou de ontem. O ambiente é despojado, mas sem aquela rusticidade fake que normalmente usam para dar “um ar de Nordeste”. O cenário é dominado por uma imensa parede de tijolo aparente sobre as quais estão painéis com fotos de Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Marinês, Trio Nordestino, Dominguinhos e João do Vale. Não precisa mais.

Curioso é que o público que vai curtir esse som tem, predominantemente, idade média de 20 a 35 anos e é bem eclético. Além de tipos como o japonês, a magrinha modernosa e a negra linda, tem mauricinho, patricinha, bicho-grilo, parrudo, perua, jovens comuns de classe média, uma ou outra pessoa mais velha... Uma mistura que, associada à animação natural do forró, cria um clima de altíssimo astral.

Para sentir esse clima, ouça:

1 ) Sala de reboco, na gravação de Luiz Gonzaga com Dominguinhos
2 ) Peba na pimenta, com Marinês
3 ) O Chevete da menina, com Genival Lacerda
4 ) Te pego na mentira, com Sivuca
5 ) Forró do xenhenhen, com Elba Ramalho
6 ) Não grude não, com Gilberto Gil
7 ) Caia por cima de mim, com Maciel Mello
8 ) Puxe o fole Zé, com Silvério Pessoa
9 ) Feriado, com Chico César
10 ) É sempre assim, com Flávio José

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