quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

AO PÉ DO OUVIDO // Esperanza no circo do Grammy

Por Rosualdo Rodrigues

Coisa esquizofrênica esse tal de Grammy. A ponto de colocar concorrendo numa mesma categoria (a de artista revelação) o malinha do Justin Bieber e a jazzista Esperanza Spalding. Mas Spalding nem deveria ser considerada revelação pelos organizadores do prêmio, afinal, apesar de ter apenas 25 anos, já gravou três discos, o primeiro em 2006. Revelação mesmo ela foi para os fãs de Bieber, que editaram a biografia da vencedora na Wikipédia, xingando-a de “retardada” e dizendo que ela “deveria morrer”. Um chegou a dizer que Spalding “não chega nem ao tênis Nike que Bieber usa para ir ao shopping na Califórnia”.

Coisa de criança malcriada e birrenta, só pode ser. Não tem como comparar a música sofisticada dela com o pop chiclete do loirinho de cabelo lambido. Basta conferir Chamber music society, o disco mais recente da violoncelista e cantora norte-americana, que acaba de sair no Brasil. É um disco de jazz atípico, porque é tão rico em nuances que segue em diferentes direções. A voz e o contrabaixo de Speranza Spalding ficam em primeiro plano quase o tempo todo, como mestres de cerimônia para os demais instrumentos.

E os conduzem em composições labirínticas. As versões dela para Wild is the wind (conhecida na voz de Johnny Mathis) e Inútil paisagem (de Tom Jobim), por exemplo, deixam as músicas quase irreconhecíveis. Não é, portanto, um disco de fácil assimilação para ouvidos acostumados ao rame-rame radiofônico. Por isso não dá para exigir dos fãs de Justin Bieber que entendam que Esperanza -- que já tocou com feras do jazz e é a mais jovem professora do Berklee College Of Music, em Boston -- merece esse e qualquer prêmio mais que o ídolo teen.

Aliás, não dá para exigir deles nem de ninguém que compreendam que mesmo em um prêmio como o Grammy, que é muito mais um circo armado para a indústria fonográfica vender seu peixe, alguma coisa eventualmente pode fazer sentido.

Em tempo: tem um vídeo legal da artista no
YouTube

Um comentário:

Cecil disse...

Oi Rodrigo, excelente seu texto sobre Esperanza, mas só uma correção: ela não é violoncelista, mas sim contrabaixista. O que a torna um fenômenos ainda mais raro, mesmo no jazz que é acostumado a inovações constanmtes... mulher jovem + tocando baixo + cantando. Muita originalidade.
Não dava pra comparar o moleque de cabelo lambido com ela no Grammy, ele não é músico. É um produto pop.
Um abraço.