segunda-feira, 28 de junho de 2010

EU RECOMENDO // Buenos Aires e seus bodegones


Marcelo Barbão (*)
Convidado especial do Gastronomix

“Todo brasileiro que vem a Buenos Aires tem uma primeira sensação: a de que voltou no tempo. Cidade cheia de tradições (e gente sempre disposta a defendê-la), a capital argentina mistura modernidade com bairros que parecem viver em alguma cidade de interior. Bares e cafés onde os vizinhos se encontram e convivem há anos.

O “bodegón”, termo que não é muito preciso em relação ao tipo de comida ou ao estilo do restaurante, nasce dessa tradição. Em geral, são restaurantes que existem há muitos anos, foram “adotados” pelos moradores locais (e ganharam fama em toda a cidade), servem porções generosas, mantém tradições culinárias que passam de pai para filho e são razoavelmente baratos.

É preciso destacar outra diferença cultural entre portenhos e brasileiros (e os outros povos que conheço): aqui “comer fora” é um dos passeios favoritos de todo tipo de classe social e faixa etária. Por isso, os bodegones - geralmente restaurantes pequenos - estão sempre lotados, em quase todos os dias da semana.

O crítico gastronômico italiano Pietro Sorba, conta em seu livro Bodegones de Buenos Aires, que estes locais nasceram como armazéns, o que pode explicar o nome de “Bodega”, que também existe em português, mas não é mais tão usado. Os armazéns que começaram a servir bebida, também incluíram petiscos, as famosas “picadas” em espanhol. Não demorou a surgirem os pratos caseiros.

O mais interessante é que os bodegones possuem características diferentes, de acordo com a nacionalidade do dono. Há alguns italianos, onde são as massas que predominam; outros, fundados por espanhóis, se especializaram em frutos do mar e pratos típicos, como a paella; já alguns poucos seguem uma tradição alemã. São todos elementos que formam a cozinha portenha, acrescentando o “asado” e pratos rápidos, como o bife à milanesa.

O que realmente nunca vamos encontrar neles são os pratos modernos dos restaurantes de Palermo ou Puerto Madero (tampouco seus preços, felizmente). Como fez a cidade de Buenos Aires, criando um selo de “Café e Bar Notável” aos cafés mais antigos e preservados de Buenos Aires, está mais do que na hora de fazer o mesmo com os “bodegones”. Dos muitos que existem (Pietro relaciona 30 em seu livro), já visitei alguns e indico os meus favoritos - até o momento.

El Obrero - Agustín R. Caffarena, 64 - La Boca
Tem um sabor especial para mim porque foi o primeiro bodegón da minha vida. Foi logo que me mudei para cá e a viagem de táxi foi uma aventura e tanto, já que ninguém sabia onde ficava a rua e o bairro de La Boca, infelizmente, está muito abandonado pelo poder público fazendo com que algumas regiões sejam assustadoras. Mas depois que chegamos, a noite mudou completamente. A comida é saborosa e generosa, o ambiente é alegre, familiar e barulhento, os garçons são simpáticos e... já falei que a comida é deliciosa?

La Maroma - Mario Bravo 584 - Abasto
Esse é para quem quer comer uma típica comida espanhola. Porções mais do que generosas. Ambiente mais informal impossível - as mesas ficam tão perto que tudo parece um grande diálogo. Os pratos incluem peixes e frutos do mar, com os molhos mais criativos que já experimentei.

Spiagge Di Napoli - Av. Independecia, 3257 - Almagro

Pelo nome seria redundante dizer que tipo de comida esse bodegón serve, não? Foi uma das melhores lasanhas a la putanesca que já comi por aqui. Segue o estilo de bodegones cheios, apertados e barulhentos. No sábado à noite com certeza haverá lista de espera. E os garçons, coitados, vão trabalhar correndo, mas não deixam a simpatia de lado".

(*) Marcelo Barbão é escritor, tradutor e jornalista. Vive em Buenos Aires desde 2008 e escreve o blog Direto de Buenos Aires (http://viajeaqui.abril.com.br/blog/direto-buenos-aires ).Conheceu Buenos Aires em 1990. Vítima de uma paixão obsessiva, voltou mais de dez vezes à capital argentina, onde vive desde 2008. É também fotógrafo, músico, tradutor e corre todas as manhãs no Parque Rivadavia porque adora alfajores.

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