quarta-feira, 10 de março de 2010

AO PÉ DO OUVIDO // Maravilhas de além-mar

Por Rosualdo Rodrigues

Há cerca de dois anos uma amiga trouxe de Portugal o disco Navega, de Mayra Andrade, e presenteou-me com uma cópia. Eu, que até então tinha o nome de Cesária Évora como sinônimo de música cabo-verdeana, passei a ter mais uma referência: uma cantora jovem, de voz linda e uma música tão boa quanto à de sua conterrânea veterana.

Por isso foi uma feliz surpresa saber que o segundo disco de Mayra, Stória stória, está sendo lançado no Brasil. Mais surpreso ainda fiquei quando soube que ele é produzido por um brasileiro, Alê Siqueira, e tem participação de músicos brasileiros, todos de primeira linha (Jacques Morelenbaum, Marco Suzano, André Mehmari, Lincoln Olivetti...).

Mayra já tinha gravado uma participação no segundo disco de Mariana Aydar (na música Beleza). Mas, ao entrevistá-la para o Correio Braziliense (por telefone Brasília-Lisboa), fiquei sabendo que suas conexões com o Brasil não são só essas. Ela já se apresentou em Rio e São Paulo e está louca para marcar mais presença em nosso país.

Tomara que consiga, porque a música dela é algo raro. Tem um parentesco com a música brasileira, mas não é a mesma coisa; tem um certo molejo africano, mas também não é por aí... Parece que o fato de estarem em alto mar deu aos cabo-verdeanos uma leveza musical que é a marca deles. A morna, ritmo mais conhecido de lá, muito cantado por dona Cesária, tem muito disso.

E Stória stória é assim, tem uma forte marcação percussiva e rítmica, mas é de uma leveza impressionante. Tem aqui e ali ecos de jazz, num fraseado de piano, num solo de trompete, mas é uma música cheia de personalidade.

O post está ficando grande, mas eu não queria deixar de falar de outro disco igualmente ótimo e que também faz ligações entre Brasil e além-mar. Fado mulato, da portuguesa Maria João Quadros, é um belíssimo exemplar do gênero fado. Curiosidade: as músicas são de brasileiros como Chico César, Zeca Baleiro, Alzira Espíndola, Francis Hime e Pedro Luís, sobre letras do poeta português Tiago Torres da Silva. Ela também incluiu Gota d'água, de Chico Buarque, e um chorinho de Paulo César Pinheiro e Ivor Lancelotti.

Maria João é fadista veterana, mas nesse disco se alinha com a renovação por que passa o gênero, feita por nomes como Mariza, António Zambujo e Mísia. Acompanhada por um afinado quarteto de violões e guitarra portuguesa, cria momentos emocionantes, como quando transforma em fado o tal chorinho, Amor alheio, ou na comovente Quando a noite adormece (de Tiago e Ivan Lins).

Dezembro ainda está bem longe, mas minha lista de melhores lançamentos do ano já tem dois títulos com lugares merecidos e reservados.

Ouça Stória stória no YouTube:
http://www.youtube.com/watch?v=0qiMl1KQvy0

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