quarta-feira, 13 de setembro de 2017

ALMANHAC // As batatas foram uma espécie de Geni dos europeus

Rosualdo Rodrigues
Colunista de Variedades do Gastronomix

Sabe aquela história da música “Geni e o Zepellin”, de Chico Buarque? Para quem não lembra: por dar para qualquer um, Geni é amaldiçoada pela sociedade, nela jogam qualquer porcaria. Mas no momento em que surge uma grande ameaça e ela é a única que pode salvar todo mundo, passa a ser a “bendita Geni”.

Foi mais ou menos esse o papel da batata na Europa, logo após a “descoberta” da América por Cristóvão Colombo, em 1492. O tubérculo era a base da alimentação dos incas, junto com milho e feijao. Mas quando os exploradores voltaram ao Velho Continente levando a batata na bagagem, os europeus acharam muito estranha a novidade.

Representantes da Igreja consideravam que, por não serem citadas na Bíblia, era bem provável que Deus não queria que os homens as comessem. Os especialistas em hervas simplesmente achavam a batata feia, parecida com as mãos de um leproso. Daí concluírem que quem a comesse iria contrair lepra.
E os botânicos botaram lenha na fogueira com argumentos pretensamente científicos. Classificaram as batatas — que até ali era um dos primeiros tubérculos a serem consumidos como alimento — como integrante da venenosa família da doce-amarga, um arbusto nativo da Eurásia e Norte da África.

Pronto. As batatas passaram a ser consideradas coisa do diabo. Mas quase um século depois, com a fome se abatendo sobre o continente europeu como um Zepelin gigante, a coisa mudou de figura. Na falta do trigo, que era então o esteio da alimentação dos europeus, restavam as batatas. Pois que fossem.

As batatas começaram a ser consumidas por irlandeses e depois em outras partes do continente.  Soldados franceses que lutaram em batalhas em Flandres (norte da Bélgica) e na Renânia (oeste da Alemanha) e na Guerra dos Sete Anos (1756-1763), na Prússia, conheceram o alimento durante as campanhas e, na volta, se tornaram defensores do seu uso no prato.

Pronto, a batata virou o pão dos pobres… E logo, dos ricos também.

Fonte: “Uma História Comestível da Humanidade” (Tom Standage). Foto: 123rf.

Nenhum comentário: