quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

AO PÉ DO OUVIDO// Caetano, político e sentimental

Por Rosualdo Rodrigues

Chegando hoje às lojas o novo disco de Caetano Veloso, Abraçaço, que fecha a trilogia composta por (2006) e Zii e zie (2008). Um disco que pode ser encarado e apreciado de, pelo menos, duas diferentes perspectivas, a depender das expectativas do ouvinte.

Quem gosta do Caetano que propõe discussões, o polêmico, certamente vai se deter em desvendar a letra cheia de referências de A bossa nova é foda (que não é uma bossa, diga-se), na qual o compositor enxerga uma relação entre a aparentemente suave batida bossanovista e a virulência do MMA. Ou se ocupar a interpretar as intenções políticas de Caetano na longa, lenta e densa O comunista, uma homenagem ao guerrilheiro Carlos Marighella.

A meio caminho desse tom político, O império da lei, guitarra e percussão dialogam contrapondo a alegria da guitarrada paraense e a tristeza e a indignação pela impunidade reinante no interior daquele estado no que diz respeito aos conflitos por posse de terras. Foi inspirada, Caetano disse em entrevista, pelo filme Eu ouviria as piores notícias de seus lindos lábios e em especial pelas cenas em que Dona Onete aparece cantando.
Para quem prefere o lado mais simples e sentimental de Caetano Veloso, Abraçaço oferece material mais farto. Em Estou triste, por exemplo, ela partilha de forma direta e pungente um momento de profunda tristeza. A melancolia da letra se apoiando no movimento repetitivo do baixo. A dançante Parabéns é uma animada mensagem de felicitações e boas vibrações de origem curiosa: a letra é o texto do e-mail que Caetano recebeu do cineasta Mauro Lima em seu aniversário.
Gayana, composição de Rogério Duarte, também se alinha nesse segundo lado do disco. Tem letra muito simples: é o desabafo de alguém que guarda um amor em segredo e finalmente o revela. Inicialmente se chamaria Hino gay. Apesar da simplicidade e letra quase óbvia, Caetano emociona ao repetir “eu amo muito você” com a mesma veemência com que cantava o sentimento oposto (“odeio você”) em Odeio, de Cê (que, aliás, mantém o posto de o melhor da trilogia).  Tem seu quê de provocação, nestes tempos em que ainda se bate em gays por andarem de mãos dadas na rua.

Por fim, vale destacar a ótima Funk melódico, na mesma linha de Miami maculelê, que Caetano fez para Gal Costa cantar em recanto. É uma releitura do gênero musical carioca, do qual mantém a estrutura (discurso + refrão bem melodioso). A letra, deliciosa, com referências a Noel Rosa, é uma pedrada contra uma certa “mulher indigesta”. Mesmo melancólico e raivoso, como aparece nos discos da trilogia, Caetano consegue ser também divertido.

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