quarta-feira, 28 de março de 2012

AO PÉ DO OUVIDO// A música e o ambiente

Por Rosualdo Rodrigues

É fato: pelo menos em Brasília, os donos de restaurantes não dão à música ambiente a importância que ela merece. Nem vamos falar dos bares – tipo aqueles que botam televisões enormes e deixam um DVD qualquer rolando e pronto. ... Vamos direto ao exemplo dos japoneses e chineses, onde não tem erro: é uma musiquinha tradicional que parece ser sempre o mesmo disco – e que a gente nem sabe se é mesmo chinesa ou japonesa, porque poderia ser de qualquer lugar da Ásia que aos ouvidos da maioria daria no mesmo.

Não sei se tão mal quanto ou pior é francês que vai de Charles Aznavour, Mireille Mattieu e afins, numa seleção que tem ares de coletânea tipo Je t’aime Paris ou Les Plus Belle Chansons... Mas esses, assim como os asiáticos, pelo menos têm a desculpa de que querem criar um clima “típico”, de acordo com a comida --- como se nos países que eles teoricamente representam gastronomicamente a música tivesse parado no tempo.

E o que falar dos que não têm essa “obrigação”? Tocar um disco inteiro atrás do outro, como fazem muitos, revela falta de personalidade... Ou então a música é aleatória, é o shufle que se tem a mão. Outro dia, e isso em plena noite de sábado, um restaurante onde se cobra R$ 71 por um risoto de camarão, tocava uma seleção de música brasileira que, definitivamente, não foi feita com o cuidado de criar um clima aprazível para o cliente.

A certa altura, depois de uma da Fafá de Belém com toda aquela intensidade dela, Milton Nascimento gemia numa dor, mas numa dor tão profunda... que dava em quem ouvia vontade de chorar (e não vai aí nenhuma crítica à Fafá nem ao Bituca, mas tudo tem sua hora). Cobrando tão caro, um restaurante como esse deveria pensar nos mínimos detalhes.

E música não é um detalhe mínimo. Não só o que toca, mas até o volume em que toca faz diferença. Mesmo quando o cliente aparentemente não está prestando atenção a ela, ele a está ouvindo e o que ele ouve tem efeito sobre seu bem-estar, fazendo-o voltar sempre àquele lugar sem nem saber exatamente por que gosta tanto dali.

Tão importante quanto desenhar um ambiente por meio de cores, estilo de móveis, decoração e iluminação é desenhá-lo por meio da música. O ideal é criar um ambiente sonoro com a intenção de atrair um tipo de público (sim, a música tem esse poder), ou, se o dono do restaurante conhece seu público, que trate de agradá-lo com uma seleção musical pensada para corresponder ao perfil desses frequentadores.

P. S. -- Ocorre-me agora um exemplo de lugar, aqui em Brasília, que harmoniza muito bem ambiente físico e música: o El Paso Texas da 404 Sul, onde as cores vivas e as muitas luzes da decoração encontram correspondência perfeita na efusividade da música latina (numa seleção atualizada, diga-se). Tudo vibrante. Quem vai lá já sabe mais ou menos o que vai ouvir, faz parte da identidade da casa.

Um comentário:

Marcela disse...

Adorei o texto Rosualdo, parabéns!

Eu fico imaginando aqui, cá com os meus botões, que esse risoto por R$71 deve até ter perdido um pouco do sabor com tamanha intensidade sonora!

E o El Paso é nota 10 mesmo!

Beijos
Marcela.