quinta-feira, 24 de julho de 2014

AO PÉ DO OUVIDO // Harmonizar mas nem tanto

Rosualdo Rodrigues
Colunista de Música do Gastronomix
Tenho visto – em blogs e em livros -- pessoas proporem harmonização de pratos com músicas. Ouvi falar até de um restaurante em Nova York onde cada comensal recebe, à mesa, um fone de ouvido para acompanhar com trilha sonora cada etapa do menu.
Adoro música – não menos do que adoro comida – e nutro especial interesse por entender os efeitos dela no cérebro, o que me leva a procurar, sempre que possível, bibliografia sobre o assunto. Mas, confesso, nunca encontrei artigo nenhum, científico ou não, que dissertasse sobre a relação direta entre o que se come e o que se ouve.
É fato que, no cérebro humano, ticos e tecos tecem uma rede de relações complexas. E, como diz Robert Jourdain no livro Música, cérebro e êxtase, “hoje, os cientistas podem observar como um ouvido dança em compasso com uma valsa e a maneira como partes do córtex cerebral ‘acendem-se’ quando Mozart circula em torno”. Ainda assim, acredito que essa “tendência” que citei lá no início exala certo cheiro de embromação.
Dizer que um pato com laranja vai bem com a música Lay, lady, lay, de Bob Dylan, por exemplo, não exige de ninguém conhecimento superior, apenas gosto pessoal. Mas há quem queira impor tal gosto como uma conclusão baseada em aspectos técnicos que o público em geral não domina.
Por enquanto, ainda me limito a acreditar que música não harmoniza com o que se come, mas sim com as circunstâncias em que se come -- o lugar, a companhia, a hora do dia... A música tem o poder de definir o ambiente e tornar mais ou menos agradável uma refeição ou um simples drinque. O resto é pose.
E para finalizar, uma recomendação musical para a semana: Stockholm, o novíssimo disco solo de Chrissie Hynde, a vocalista do The Pretenders. Chrisse, que em 2004 fez uma turnê no Brasil com Moreno Veloso e há seis anos não grava com a banda, mostra que continua afiadíssima, cantando como sempre. O CD traz uma coleção de baladas rock que, de tão boas, harmonizam com o que você bem quiser comer. You or no one é a primeira delas.

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