quarta-feira, 1 de setembro de 2010

AO PÉ DO OUVIDO // Música para ver

Por Rosualdo Rodrigues

Desde que surgiu o DVD, os lançamentos se sucedem. Virou um tipo de obrigação: todo artista tem que ter o seu. O problema é que, por conta disso, a maioria dos lançamentos são, digamos, burocráticos. Filma-se um show e pronto. É como se fosse oferecido ao público a opção de ouvir o disco simplesmente ou ouvir e ver o disco. Alguns você pode deixar rolar no DVD player na sala, enquanto faz algo na cozinha, que não fará diferença. A meu ver, esse suporte é subestimado. Parece que ninguém aprendeu a lição dada por Jonathan Demme quando filmou, em 1984, Stop making sense, do Talking Heads — definitivamente, um dos melhores vídeos musicais de todos os tempos.

Quer dizer, não basta fazer um show com cenário bonitinho, plateia monstra e dois ou três convidados. Os DVD deveriam ser pensados como filmes, deveriam oferecer algo a mais do que aquilo a que o ouvinte está acostumado. Mesmo a mera gravação de um show pode ir além do corriqueiro. Bons exemplos são dois DVDs que acabam de ser lançados aqui no Brasil. Live in London with BBC Concert Orchestra, de k. d. lang, e London Calling live in the Hyde Park, de Bruce Springsteen. São duas amostras de como sair do óbvio e fazer com que a gente não queria sair de frente da tevê.

A voz de k. d. lang, a belíssima iluminação que dialoga com a luminosidade dos vitrais da igreja de St. Luke, em Londres, os violinos celestiais da BBC Concert Orchestra, o repertório de canções selecionadas entre diferentes fases da carreira da cantora canadense… Tudo colabora para fazer Live in London, no mínimo, emocionante. O poder vocal de lang se adequa de forma magnífica aos arranjos orquestrais — que tendem à delicadeza e não à grandiosidade. E tem ainda a elegância (visual e musical) da banda da cantora, que faz deixa os instrumentos para fazer um arranjo vocal em Jealous dog (anunciada por ela como “mais uma canção autobiográfica. É sobre k. d. lang”).

Bruce Springsteen, por sua vez, surge impressionante em London Calling live in the Hyde Park . Pela energia incomum para seus 61 anos e por manter a capacidade de levantar multidões. Diante de uma plateia que se perde de vista, no início de uma noite de verão de 2009 em Londres, ele sua às bicas, fica ofegante às vezes (como quando resolve correr pelo fosso que o separa do público), mas não deixa apagar o carisma e o domínio musical que o consagraram, insuflando a plateia com discursos e fazendo-a cantar em coro músicas como Born to run e Working in a dream ou em covers, como o de London calling, de Joe Strummer. A empolgação do artista e da plateia, somada à espetacular qualidade da filmagem — que faz o telespectador se sentir no ambiente do show — , é capaz de prender diante da tevê mesmo quem não tem familiaridade com o obra do músico.

Veja no YouTube:

Trecho do DVD de k. d. lang (cantando Hallelujah, de Leonard Cohen)
http://www.youtube.com/watch?v=P_NpxTWbovE&feature=fvw

Trecho do DVD de Bruce Springsteen (cantando London Calling, de Joe Strummer)
http://www.youtube.com/watch?v=9o_YqNN4cDQ

Trecho de Stop making sense (Life during the wartime)
http://www.youtube.com/watch?v=QXgMhnI3QOI

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